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V - Budismo
A Filosofia do Despertar e a Construção dos Seus Textos Sagrados
Por António Cunha
Publicado em 26/10/2025 08:00
História, Filosofia & Religião

 

Para ler antes da leitura do artigo

Falar sobre religião é, por natureza, delicado. As crenças religiosas estão entre os pilares mais profundos da identidade humana — e por isso, este tema pode gerar polémica, discordância e até mal-entendidos. Mas é precisamente por isso que ele deve ser abordado com seriedade, respeito e rigor.

Esta série de artigos foi construída com base em fontes académicas e históricas reconhecidas, procurando evitar ao máximo opiniões pessoais. Ainda assim, reconhecemos que interpretações podem variar, e eventuais incorreções podem surgir. Por isso, convidamos o leitor a participar: se identificar algo que mereça correção, por favor indique claramente onde, quando e porquê.

Mais do que uma análise teológica, esta reportagem pretende ser um exercício de formação de cultura geral. É dirigida ao público em geral, com linguagem que pretendemos seja acessível, e tem como objetivo estimular a reflexão crítica sobre o papel das religiões — enquanto fenómenos filosóficos, sociais e espirituais — na evolução da humanidade.

Num mundo cada vez mais plural, é essencial aprendermos a respeitar as diferenças religiosas e culturais. Não precisamos concordar com tudo, mas precisamos compreender. E compreender é o primeiro passo para conviver em paz.

O budismo é uma das tradições espirituais mais influentes da história humana. Nascido na Índia há mais de 2.500 anos, ele não se apresenta como uma religião centrada em um deus criador, mas como um caminho filosófico e ético para a libertação do sofrimento. Ao longo dos séculos, o budismo gerou uma vasta literatura sagrada, moldada por diferentes culturas, escolas e interpretações. Neste artigo, exploramos as origens históricas e culturais do budismo, os textos que o compõem, os povos e personagens envolvidos na sua criação e transmissão, e as principais versões e tradições que o tornaram universal.


1. As Origens Históricas: A Índia do Século VI a.C.

O budismo surgiu no contexto da Índia védica, uma sociedade marcada por rituais complexos, castas rígidas e uma elite sacerdotal dominante. Nesse ambiente, emergiram movimentos de contestação, como o sramana, que buscavam caminhos alternativos para a libertação espiritual, fora dos dogmas bramânicos.

Foi nesse cenário que nasceu Siddhartha Gautama, o Buda, por volta de 563 a.C., no atual Nepal. Príncipe de uma família nobre, ele abandonou a vida palaciana para buscar respostas sobre o sofrimento humano. Após anos de meditação e ascetismo, alcançou o nirvanao despertar — e passou a ensinar o Caminho do Meio, baseado em ética, meditação e sabedoria.


2. Os Textos Sagrados do Budismo

O budismo não possui um único texto sagrado. A sua literatura é vasta e diversa, dividida em três grandes coleções conhecidas como o Tripitaka (Três Cestos):

a) Vinaya Pitaka – Disciplina Monástica

Regras de conduta para monges e monjas, regulando a vida nos mosteiros e a ética comunitária.

b) Sutta Pitaka – Ensinamentos do Buda

Discursos atribuídos ao Buda e aos seus discípulos, incluindo:

  • Dhammapada: versos éticos e filosóficos.
  • Sutta Nipata: textos poéticos sobre meditação e compaixão.
  • Majjhima Nikaya: discursos médios sobre prática espiritual.

c) Abhidhamma Pitaka – Filosofia e Psicologia

Análises profundas da mente, da realidade e dos estados de consciência.

Além do Tripitaka, outras tradições budistas desenvolveram os seus próprios textos:

  • Mahayana Sutras: como o Sutra do Lótus, Sutra do Coração e Sutra da Perfeição da Sabedoria.
  • Tantras Vajrayana: textos esotéricos tibetanos sobre meditação e visualização.
  • Jataka Tales: histórias das vidas anteriores do Buda.

3. Povos e Culturas Envolvidos na Formação do Budismo

  • Índia Antiga: berço do budismo, onde os primeiros textos foram preservados oralmente em pali e sânscrito.
  • Sri Lanka: local da primeira compilação escrita do Tripitaka, no século I a.C.
  • China: traduziu e adaptou os sutras ao pensamento confucionista e taoista.
  • Tibete: desenvolveu o budismo vajrayana, com textos próprios e práticas ritualísticas.
  • Sudeste Asiático: preservou o budismo Theravada, com foco nos ensinamentos originais do Buda.
  • Japão: criou escolas como Zen e Terra Pura, com textos e práticas distintas.

4. Personagens-Chave na Transmissão do Budismo

  • Siddhartha Gautama (Buda): fundador e principal fonte dos ensinamentos.
  • Ananda: primo e discípulo do Buda, responsável por memorizar e transmitir os seus discursos.
  • Ashoka, o Grande: imperador indiano que promoveu a expansão do budismo no século III a.C., patrocinando a construção de estupas e a difusão dos ensinamentos.
  • Kumarajiva: tradutor que levou os sutras para a China, influenciando o budismo Mahayana.
  • Padmasambhava: figura central na introdução do budismo no Tibete.

5. Compilação e Versões dos Textos Budistas

Após a morte do Buda, os seus discípulos realizaram concílios budistas para preservar os ensinamentos:

  • Primeiro Concílio (c. 400 a.C.): compilação oral dos discursos e regras monásticas.
  • Terceiro Concílio (século III a.C.): sob Ashoka, padronização dos textos e envio de missionários.
  • Quarto Concílio (século I a.C.): em Sri Lanka, os textos foram escritos pela primeira vez em folhas de palmeira.

As versões dos textos variam conforme a escola:

  • Theravada: preserva o Cânone Pali, considerado o mais próximo dos ensinamentos originais.
  • Mahayana: amplia os textos com novos sutras e interpretações.
  • Vajrayana: inclui tantras e comentários esotéricos.

6. O Budismo como Caminho Filosófico e Cultural

O budismo não impõe dogmas, mas propõe uma experiência direta da realidade. Os seus textos são guias para a prática da meditação, da ética e da sabedoria. Ao longo dos séculos, o budismo influenciou profundamente a arte, a arquitetura, a medicina, a psicologia e a política em diversas culturas.

Apesar de sua mensagem de compaixão e não-violência, o budismo também enfrentou momentos de instrumentalização política, como em regimes autoritários que usaram os símbolos budistas para legitimar poder, ou em conflitos entre escolas rivais.


O Budismo como Herança Filosófica da Humanidade

O budismo é uma tradição que transcende fronteiras, línguas e dogmas. Os seus textos sagrados são testemunhos de uma busca milenar por liberdade interior e compreensão da existência. Compreender as suas origens é reconhecer a profundidade da experiência humana — e a capacidade de transformar sofrimento em sabedoria.


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